O hábito alimentar pouco saudável do brasileiro é um grande desafio a ser vencido na área de saúde. Isso porque os principais fatores de risco para o desenvolvimento de doenças cardíacas, como hipertensão arterial, diabetes mellitus, dislipidemias, principalmente triglicerídeos elevados, passam pela alimentação.
Durante a pandemia, inclusive, houve aumento significativo no consumo de fast food, pães e refeições instantâneas e a diminuição da ingestão de frutas e vegetais. As doenças cardiovasculares são a principal causa de mortes no mundo, por isso, a questão é de saúde pública.
Marcelo Heitor Vieira Assad, presidente do Departamento de Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), alerta que os alimentos ultraprocessados, ricos em sódio, contribuem para o aumento da pressão arterial, com impacto relevante.
Já uma alimentação rica em carboidratos, açúcar refinados e doces contribui para a obesidade e para o diabetes mellitus. O alto consumo de gorduras também favorece o desenvolvimento de dislipidemia, ou seja, a presença de níveis elevados de lipídios no sangue, principalmente triglicérides elevados, além do colesterol. “No caso do colesterol, 80% é produzido pelo próprio fígado, mas 20% têm impacto alimentar, então a alimentação correta acaba sendo uma aliada nesse controle”, explica Assad.
Segundo Ana Maria Lottenberg, nutricionista do Núcleo de Nutrição do Departamento de Aterosclerose da SBC e pesquisadora do Laboratório de Lípides do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), além do alto consumo de alimentos ultraprocessados, os brasileiros ingerem apenas meia unidade de fruta por dia, quando o recomendado são de três a quatro porções.
“A ingestão de vegetais também é muito baixa, e se pensarmos que mais da metade da população tem sobrepeso e 30% tem obesidade, podemos concluir que o consumo calórico da população brasileira é bem elevado, muito maior do que precisaria”, alerta. Portanto, o ponto de partida é a adequação das calorias da dieta.
Hipertensão
Não há alimentos isolados que contribuem para a diminuição de pressão arterial em hipertensos. O ideal é seguir padrões alimentares saudáveis ricos em frutas, verduras e legumes, grãos integrais e carnes magras, além de adequação do consumo de sal. A dieta DASH (Dietary Approach to Stop Hypertension), considerada um padrão alimentar saudável, foi elaborada na década de 90 justamente para ajudar a reduzir a pressão arterial. Os pesquisadores dividiram os pacientes hipertensos em três grupos.
O primeiro consumiu menos sal; o segundo, além da redução de sal, consumiu alimentos ricos em potássio, como frutas, legumes, hortaliças e grãos; e o terceiro grupo, além dessas mudanças, também reduziu a ingestão de gorduras.
O estudo mostrou que a diminuição de gorduras na dieta associada a alimentos vegetais foi o padrão que melhor se associou à redução da pressão arterial. “Mas é importante lembrar, também, a importância da redução no consumo de sal, pois a população brasileira consome mais de 10 gramas todos os dias, enquanto o recomendado são 5 gramas”, alerta Ana Maria.
Ultraprocessados
De fácil consumo, os alimentos ultraprocessados têm alto valor calórico e não possuem fibras. Eles podem ser ricos em gorduras, sal ou açúcar, e geralmente possuem corantes e realçadores. Estudos nacionais e internacionais mostram que o aumento da ingestão de ultraprocessados tem relação direta com o aumento de peso, portanto, seu consumo aumenta o risco cardiovascular. O termo ultraprocessado foi criado no Brasil, utilizado pela primeira vez no Guia Alimentar Brasileiro, produzido pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. O material é usado internacionalmente por vários autores ao redor do mundo.
Como mudar um hábito
Qualquer mudança é difícil e exige disciplina. No caso do hábito alimentar, muitas pessoas acreditam que uma dieta saudável implica em comer apenas alimentos que não são saborosos. “Por isso é importante não haver divisão entre alimentos proibidos e permitidos, porque atrapalha a aderência a um padrão alimentar saudável”, ressalta Ana Maria.
Segundo ela, o principal é fazer as pessoas entenderem que seguir uma dieta não significa estar de “castigo”, mas aderir a um padrão alimentar saudável. “Aumentar gradativamente o consumo de grãos, legumes, verduras e frutas na dieta ajuda mais a introduzir alimentos saudáveis na dieta do que somente fazer proibições”, acrescenta.
Quando se trata de conscientização das pessoas, o papel do governo é fundamental, por isso são necessárias políticas de saúde pública associadas à segurança alimentar. “Há vários programas de nutrição no Brasil, mas o governo precisa ser mais cuidadoso em relação às propagandas, principalmente àquelas voltadas ao público infantil. Os iogurtes, por exemplo, são mais um docinho do que uma fonte de cálcio”, observa a nutricionista. Para Ana Maria, o ponto fundamental é a educação nutricional desde a primeira infância, para que as crianças cresçam já aprendendo o que é um hábito alimentar saudável.
Nesse sentido, a SBC desenvolveu o programa SBC vai à escola, que oferece orientações contínuas de como criar um estilo de vida saudável, visando à prevenção e à promoção da saúde cardiovascular dos estudantes das redes municipal e estadual de ensino fundamental e médio. A união entre saúde e educação é a melhor estratégia.
Fonte: Sociedade Brasileira de Cardiologia
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